Do mito oral ao mito audiovisual

Uma análise da transposição como experiência narrativa de identidades regionais e subalternas

Resumo

Em um contexto global marcado pela hegemonia da comunicação neoliberal, na Argentina, durante os anos 2010-2014, foram desenvolvidos uma dezena de concursos públicos para promover a produção de conteúdos audiovisuais regionais, que procuravam democratizar, descentralizar e diversificar o espaço audiovisual nacional, que historicamente é dominado pela lógica do mercado e da centralização na capital, Buenos Aires. Um dos meios de divulgação de maior impacto pelo seu carácter inédito, foram as séries de ficção federais, das quais as mitologias populares acabaram por ser um dos temas mais recorrentes. Neste cenário, questionamos os processos de transposição das mitologias populares para séries audiovisuais regionais, alertando que, para além da sua capacidade de espetacularização, constituem experiências de identidades narrativas, regionais e subalternas. Nesse sentido, então, tentamos compreender a rede de significados políticos que esses procedimentos contêm. Especificamente, a partir de um corpus de dez séries audiovisuais, neste artigo apresentamos a análise hermenêutica interpretativa da ficção saltenha “El Aparecido” (2010), que narra a crença popular sobre o mito de “El Familiar” a partir da criação de uma nova mitologia que ressignifica a cultura de pertencimento. Metodologicamente, desenvolvemos uma análise da transposição a partir de três operações prévias: o reconhecimento do contexto de produção da série, a análise da própria série e a realização de entrevistas com seus autores.